Militismo, Ilusão ou Esperança?

Dizem os antigos que depois da tempestade vem a bonança. O Atlético de Milito materializa essa máxima antiga

O treinador Gabriel Milito completou 10 (dez) jogos à frente do Atlético de forma avassaladora e espetacular. Sete vitórias, três empates, nenhuma derrota, 23 (vinte e três) gols marcados, 8 (oito) gols sofridos e fantásticos 80% (oitenta por cento) de aproveitamento. E o melhor de tudo: o argentino resgatou a alegria de jogar, a confiança e a autoestima de todo o elenco atleticano.

Ainda que não tenha tido aquele tempo suficiente e ideal para treinar e recuperar física e mentalmente o time em razão de um calendário insano e perverso, intercalado com viagens longas e quase sempre de logística pesada e onde se alternam seguidamente jogos de três competições de complexidades e características distintas, Milito vem surpreendendo especialistas, assustando os adversários e os inimigos de sempre do Galo, encantando e fazendo a Massa sonhar.

Dizem os antigos que depois da tempestade vem a bonança. O Atlético de Milito materializa essa máxima antiga. Não é preciso ser um profundo conhecedor do mundo dos vestiários para perceber que jogadores, treinador e comissão técnica, aqui compreendida em seu todo, i.e., Milito, seus auxiliares de confiança e o staff permanente, vivem uma verdadeira e auspiciosa lua de mel.

Os olhares e os afagos trocados e flagrados em vários momentos entre o treinador e os atletas, as efusivas comemorações dos gols, a clara e inescondível cumplicidade entre jogadores, comandante e demais membros da comissão técnica, a presença e a liberdade de Lucas Gonçalves no banco atleticano e a entrega de todos aqueles que entram em campo, se reiventando e revelando uma multifuncionalidade tática até então insuspeita, escancaram que o encontro entre o treinador argentino e o Atlético foi mais que um amor à primeira vista. Foi o renascer da esperança e da alegria.

Os jogadores alvinegros encontraram em Milito aquilo que tanto precisavam. Desde sempre e, ainda que o futebol de hoje em quase nada lembre aqueles tempos plásticos e lúdicos, a alma do boleiro é eterna. Para que um jogador ou um grupo de jogadores renda em nível de excelência, ou seja, entregue aquilo que dele ou deles se espera, é preciso que o vestiário transpire paz, harmonia, alegria e cumplicidade, não só na relação horizontal, i.e., entre eles, mas também na relação vertical.

O trinômio confiança, respeito e o gostar são a base de um vestiário sadio. E está mais do que claro que um campo de neve ao meio dia que o grupo confia, respeita e gosta muito do argentino.

Futebol não é ciência exata e revezes, algumas vezes bastante dolorosos, acontecem. O Criciúma, por exemplo, já “roubou” 2 pontos do Atlético dentro da Arena MRV naquele empate amargo na segunda rodada do Brasileirão. Longe de querer dar uma de Mãe Diná, aquela saudosa e polêmica sensitiva, afirmo que outros resultados indigestos advirão.

E é preciso ter maturidade e proficiência para enfrentar estes momentos. Se chegar ao topo é difícil, quase sempre penoso, e exige trabalho, planejamento, perseverança e muitos cuidados, permanecer na prateleira de cima é muito mais complicado e desafiador. Torcida, dirigentes, treinador, comissão técnica e funcionários ligados diretamente ou não ao futebol, têm, cada qual, e considerando o seu grau de envolvimento, de influência e de poder de decisão, uma missão fundamental.

Cabe à Massa continuar jogando junto com o time, apoiando e abraçando cada jogador e o treinador e, nos jogos em casa, transformando a Arena naquele caldeirão sonhado. E, além de tudo isso, vigiar e cobrar sempre com inteligência, parcimônia e de forma construtiva.

Cabe aos comandos do clube e da SAF cuidar de forma harmônica diligente e proficiente da instituição Atlético para que a maionese alvinegra não desande. No artigo À SAF o que é da SAF e ao Clube o que é do Clube, publicado no Fala Galo em 30 de março último, escrevi que o mais importante é “saber diferenciar o que é da SAF do que é do clube. É saber como proteger os direitos pétreos e inegociáveis do clube e saber como cobrar e exigir uma gestão transparente, sóbria e eficiente da SAF, de modo que este modelo societário híbrido viceje e dê os frutos que todo Galista apaixonado sonha.

É saber, também, exigir regras claras de compliance. É saber, outrossim, cobrar da SAF os instrumentos e os fóruns que garantam ao clube originário voz e determinados poderes de veto e a ela própria uma gestão eficaz”.

Em um clube de futebol, independentemente de seu modelo societário, o sucesso e os resultados esportivos são influenciados por uma gama de fatores complexos e por um conjunto de ações e interesses variados de um leque multifacetado de agentes externos que influenciam o desporto e, os clubes em particular, com graus de poder diferenciado. Daí, porque é importante que ambos, SAF e clube originário, funcionem bem e harmoniosamente. Ou seja, é preciso entender que basta um fracassar para o projeto fazer água.

Por outro lado, há sempre desgaste em qualquer relação. Não existe lua de mel que dure para sempre. Se este “MILITISMO” é uma mera ilusão ou se é de fato uma esperança fincada em bases concretas só o tempo e o trabalho desenvolvido dirão.

Foi pensando nisso que, nos artigos O périplo de Milito: Uma jornada que se inicia em meio a uma decisão e uma estréia na Libertadores, publicado aqui no Arquibancada do Galo em 28 de março passado, e O Galo de Milito. Nuances táticas e outras coisas mais, publicado no Fala Galo em 16 de abril, escrevi, dentre outras coisas, que o treinador argentino havia iniciado “uma jornada em solo tupiniquim que tanto pode ser fascinante quanto se transformar em uma caminhada rumo ao cadafalso”.

E acrescentei: “se os verdadeiros e graves problemas internos do Atlético não forem atacados de frente, enfrentados e saneados qualquer treinador, seja ele quem for, será sempre uma aposta. Assim, o trabalho de Milito deve ser cercado de muitos cuidados. Se de um lado, cabe ao clube dar-lhe as melhores condições de trabalho possíveis, de outro cabe à torcida abraçá-lo, deixá-lo trabalhar e jogar com o time”.

Como o próprio Milito fez questão de deixar claro em sua coletiva, ele está aqui há pouquíssimo tempo. É apenas um início de trabalho. De um trabalho que precisa ser protegido. Assim, se cada atleticano fizer a sua parte já será dado um grande passo rumo à glória eterna.

Trabalho, planejamento, cuidados, vigilância, parcimônia, cobrança e crítica construtivos e, claro, paciência e caldo de galinha, não fazem mal a ninguém. Aliás, são as armas ideais para o Atlético vencer as guerras que terá pela frente. Enfim, nunca foi tão importante conjugar o verbo esperançar. Ou seja, fazer por onde a esperança que hoje nos aquece e embala se transforme em algo concreto e pujante. Fazer diferente disso é deixar se embriagar pela ilusão.

Fotos: Pedro Souza/Atlético
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Max Pereira

Atleticano e humanista. Um povocador nato. Engenheiro e Auditor Fiscal aposentado. Escritor nas horas vagas.